Aborto é crime. Crime? Até que ponto? Até onde uma pessoa pode ser considerada culpada por “tirar” a vida de outra?
Fui nascida e criada no Evangelho e, de acordo com a educação cristã que recebi - e até independente dela-, sou totalmente contra o aborto. Contra até o ponto em que tenha havido uma consciência do que foi feito para gerar uma criança, até o momento em que uma mulher, por vontade própria, resolveu correr os riscos de se encontrar na condição de grávida. E não apenas uma mulher, mas também uma adolescente que não foi responsável o bastante para prevenir-se. Mas... Como querer atirar pedras em uma pessoa que foi vítima de uma violência? Como querer dizer o que é certo ela fazer quando isso significa mudar o curso de toda a sua vida e, até pior, pôr em risco a sua própria vida?
Os jornais têm mostrado recentemente o caso de uma menina de apenas nove anos (eu diria que “pasmem”, mas, infelizmente, isso já se tornou tão comum) que foi abusada sexualmente pelo padrasto, ficou grávida de gêmeos e foi submetida ao aborto. De acordo com os médicos, tratava-se de uma gravidez de alto risco, já que o corpo e os órgãos da menina ainda não estão prontos para suportar uma gestação. A mãe não quis correr o risco. A lei assegura a escolha. Mas a Igreja... Ah, a Igreja Católica, representada pela figura do arcebispo Dom José Cardoso Sobrinho, achou certo excomungar todos que participaram do processo abortivo. A menina foi “perdoada”, por ser julgada inocente. E o padrasto? Bem, talvez o crime cometido por ele não tenha sido tão grave assim, pois ele continua em comunhão com a Igreja.
O arcebispo afirmou que devemos salvar vidas, e não tirar. Mas tentar manter essa gravidez não seria como decretar a morte da criança, já que a medicina, a real entendida do assunto, assegurou os riscos que ela correria? E como seria para essa menina ter que assumir uma responsabilidade tão cedo? Que amor ela poderia dar aos filhos – caso todos saíssem vivos dessa – ao lembrar-se da maneira como eles chegaram até ela?
Qualquer aborto, independente das razões que tenham levado até ele, é um assassinato, pois se interrompe a vida de um ser que estava se formando. Mas, sem fazer questão alguma do perdão e da benção do arcebispo, afirmo que não pensaria duas vezes antes de me submeter a um, caso fosse vítima de estupro. Eu não saberia olhar com bons olhos o fruto de uma covardia e de uma violência revoltantes. Eu desconheceria o amor de mãe. Assim como o arcebispo desconhece o amor de pai e não tem tanta moral assim para julgar certo pôr em risco a vida de uma filha.